O desespero de Temer
A fragilidade do poder executivo não é novidade nos últimos tempos. Em 2014, com o começo da operação Lava-Jato, era a vez do PT, os perseguidos. Moro, o vilão. A imprensa? Golpista.
Uma presidente foi eleita e deposta, políticos de diversos partidos caíram e, graças à “perseguição do Judiciário”, o povo brasileiro foi capaz de enxergar quem realmente o representa. O problema aqui não é um partido político, é a política em si. Se fosse um caso unipartidário, não estaríamos vivendo até hoje momentos diários de adrenalina intensa ao abrir o jornal pelas manhãs.
Desde os áudios vazados como parte da delação premiada de Joesley Batista, o governo Temer vai por água abaixo. Com direito à filmagem de seu assessor “de boa índole” carregando mala rica em propina, prisões de importantes figuras de seu governo como Henrique Eduardo Alves e, é claro, acusações e investigações de políticos de seu governo, como Moreira Franco, Aloysio Nunes, Marcos Pereira, entre outros.
Nesse cenário de instabilidade e desesperança para o povo brasileiro, o discurso do presidente Michel Temer nesse 27 de junho foi uma pífia estratégia de marketing. E, como já sabemos, de trabalho sujo marqueteiros entendem bem no nosso país. João Santana que o diga. Desde ontem, o presidente Temer tem a honra de ser o primeiro presidente do Brasil formalmente acusado de corrupção durante o mandato ( e que honra)! Me pergunto se comemorou comendo quantias absurdas de Haagen Dazs em plena crise política. Em seu pronunciamento, mesmo após ressaltar que não se tratava de um, Temer se preocupou mais em atacar o procurador geral da República, Rodrigo Janot, do que em explicar o conteúdo das delações. Pelo contrário, ele, esperto, começou falando sobre a “ficção” das provas, embora tenha sido ouvido no grampo de Joesley Batista, um dos maiores empresários do país.Temer se referiu a ele, com desgosto, como o “grampeador” (apesar de sua relação previamente próxima com direito a empréstimo de avião particular e conversas sobre a vida fit, emagrecimento e sobre as frustrações de morar no Alvorada). Irônico.
Amizades na política têm disso.
Tentou também dar aula de Direito Constitucional. Citou parágrafos da Constituição e atacou, de novo, o atual procurador da República. Um claro sinal de desespero, fraqueza e de tentar tirar o foco de seus atos gravados em áudio. Mas não para por aí… Seu discurso também incluiu uma crítica ao ex-procurador Marcelo Miller (que atuou na Lava-Jato), ex braço direito de Janot e que, atualmente trabalha em um escritório contratado pela JBS especializado em delações premiadas. Segundo o presidente, Miller não cumpriu a quarentena prevista na Constituição antes de atuar no escritório. Advogado de profissão e formado pela USP, acabou deixando de lado o fato da quarentena estar apenas prevista para juízes por lei (o texto ainda não foi finalizado). Acrescentou também que, aparentemente, ambos os procuradores querem “parar o país” e cometem “um atentado“ para fazê-lo. Acusações atrás de mais acusações. "Estratégia de defesa" é o que dizem por aí.
Finalmente, nosso presidente, (será que ainda por muito tempo?) normalmente um político com característica amena, calma e otimista apelou para as últimas cartas que lhe restam em sua manga. Nessa tarde, fez um pronunciamento enfático, fraco em conteúdo e defesa, com direito a 40 minutos de atraso, pouca presença de personalidades importantes no mundo da política e, mais importante, sem seu importante aliado, Rodrigo Maia ao seu lado.
Salve-se quem puder. Parece que não é só o Alvorada que está assombrado. Temer tem muito o que temer.
Imagem: Reuters
https://www.reuters.com/article/us-brazil-corruption-temer-idUSKBN19H2PG